A importância da boa higiene e hidratação íntima
Este é o primeiro artigo oficial deste blog, da Pele Bem Formada! 🙂 Um blog que espero que seja um espaço para mim, mas também para partilhar muito convosco!
E resolvi começar por falar de algo muito meu, muito nosso das mulheres: das nossas vulvas e vaginas! Algo do qual se fala muito pouco. Que ainda continua a ser um tema tabu, com muitos mitos e crenças. Não só a nível sexual, mas também a nível da sua higiene e cuidado. E por isso decidi esclarecer alguns dos mitos que mais ouvi aos longo dos meus 16 anos como farmacêutica comunitária.
Mitos mais comuns
1. Devemos lavar a região íntima com sabão rosa
Esta era a solução usada antigamente: não existia nada além de sabão, e o tom rosa do mesmo era associado à mucosa feminina. Mas nada mais errado: o sabão tem um pH demasiado elevado (o pH vulvar/vaginal ideal varia entre 3,5-4,7). Esta elevação do pH contribui para aumentar o risco de infeções (pois afeta a nossa microbiota), ao mesmo tempo que deslipida a nossa pele e mucosa, causando desidratação, o que origina mais desconforto (prurido, sensação de ardimento e de repuxar).
2. Deve usar-se apenas água na lavagem íntima
Diga-me, lava o seu corpo só com água? Limpa a sua casa só com água? Não, pois não? Porque sabe que a água não é suficiente para arrastar toda a sujidade. Na região vulvar/vaginal é o mesmo: é necessário sempre um agente de lavagem (denominado tensioativo), que seja suave para a lavagem, que ajude a manter a integridade da microbiota vaginal e o seu pH.
3. Devemos lavar a região íntima com soluções anti-sépticas
Apenas o devemos fazer por indicação de um profissional de saúde: usar antissépticos de forma regular apenas ajuda a alterar a microbiota local (as nossas queridas bactérias e leveduras que vivem em comunidade e que nos ajudam a aumentar a resistência da zona a infeções). Estes desequilíbrios podem sensibilizar e originar mais infeções.
4. Se tenho comichão ou ardimento na região íntima, estou com uma infeção
Nem sempre! A região vulvar é uma zona mais sensível e suscetível do que outras zonas da pele. E está mais exposta a agentes agressores (urina, oclusão, secreções vaginais, fricção…), estando mais sujeita a dermatites de contacto irritativo ou alérgico. Uma higiene adequada e hidratação podem por vezes resolver estas questões.
5. Devo lavar a região íntima várias vezes ao dia
A lavagem excessiva apenas ajuda a remover a nossa microbiota e a remover o filme hidrolipídico (a primeira barreira da pele que é facilmente removida pela lavagem). Ou seja, deixa a zona mais sensível. Salvo indicação por um profissional de saúde, uma ou duas vezes ao dia é mais do que suficiente para manter a região bem higienizada.
6. Devo usar uma esponja na higiene íntima
Nada mais errado: as esponjas são fontes de acumulação de microrganismos: basta usar a nossa mão para aplicar o agente de limpeza, e posteriormente enxaguar bem com a mão ou diretamente com o chuveiro (sem grande pressão).
Em suma, as nossas vulvas e vaginas são zonas de pele delicada: mais suscetíveis a agressões, sensibilizações e infeções. Devemos cuidar das mesmas. Mas como? Deixo aqui as minha sugestões.
Como cuidar das nossas vulvas e vaginas?
1. Usar os produtos certos!
Na higiene (1-2x máximo por dia e após atos sexuais), devem usar-se produtos de pH ácido (que ronde os 4-5) e que sejam preferencialmente enriquecidos com ácido láctico, que é um hidratante natural da pele (reforça a hidratação da zona) e que ajuda a manter o equilíbrio acídico e também da microbiota vulvar e vaginal. Os famosos géis de higiene íntima serão os mais adequados. O importante é verificar o pH (geralmente é indicado na embalagem), se é enriquecido com ácido láctico (é uma característica plus, que também deverá estar descrita na embalagem) e se não contém algum antisséptico (iodopovidona ou clorohexidina). De preferência sem perfume pois minimiza reações de hipersensibilidade. A higiene deverá sem feita da frente para trás.
2. Evitar cuecas apertadas
Deve evitar-se o uso de cuecas demasiado apertadas (quem não se importar, pode e deve dormir sem roupa interior), de pensos higiénicos com regularidade.
3. Analisar os sintomas de hipersensibilidade
No caso de existirem sintomas sucessivos de hipersensibilidade frequente (prurido, desconforto, ardimento) e depois de descartada com um profissional de saúde a possibilidade de alguma infeção, deve tentar perceber-se a causa (roupa íntima, pensos, lubrificantes perfumados, produto de higiene…) e remover a mesma. Por vezes a simples hidratação diária com um produto hidratante é suficiente para resolver estes desconfortos (existem hidratantes vulvares que se destinam a aplicar externamente e hidratantes vaginais de aplicação interna). A hidratação deve ser sempre feita após a higiene diária. Nada como experimentar!
4. Evitar toalhitas, perfumes e desodorizantes
Deve evitar-se o uso de toalhitas pois são fonte de irritação e alteração do pH/microbiota vaginal.
O uso de perfumes e desodorizantes deve ser evitado; em caso estritamente necessário, devemos usar produtos adequados à zona.
5. Ter alguns cuidados extra em caso de menopausa
Na menopausa, ocorrem alterações importantes na nossa mucosa. Uma delas é a subida do pH e aqui é mesmo muito importante tentar contrariar esta tendência e ter cuidados redobrados. No caso da região estar muito desidratada, poderão usar-se hidratantes vulvares ou vaginais (atenção, não confundir com os lubrificantes, que se destinam a lubrificar a vagina no ato sexual). Estes hidratantes podem e devem usar-se diariamente, para conferir hidratação, conforto e reduzir a sensibilidade da zona. Por indicação médica, poderá ser prescrita suplementação hormonal de substituição.
Não se esqueçam que devem sempre seguir as indicações do vosso profissional de saúde. No entanto, posso dizer-vos que, lamentavelmente, ainda existem muitos que apregoam alguns destes mitos. Mas em caso de dúvidas, podem sempre pedir uma segunda opinião.
Referências Bibliográficas
Chen Y, Bruning E, Rubino J, Eder SE. Role of female intimate hygiene in vulvovaginal health: Global hygiene practices and product usage. Womens Health (Lond). 2017
Murina F, Caimi C, Felice R, Di Francesco S, Cetin I. Characterization of female intimate hygiene practices and vulvar health: A randomized double-blind controlled trial. J Cosmet Dermatol. 2020
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Francisco Ferreira
29 de Agosto, 2023Muito bom artigo! Parabéns!!